quarta-feira, 1 de outubro de 2014




A Cobra e o Lagarto

Era uma vez, uma Cobra Malhada e um Lagarto Pintado.Ambos partilhavam o mesmo carreiro para atravessarem da zona dos silvados para irem á horta do  «Tio José».
O Ti já tinha assistido a várias escaramuças entre eles, pois de há muito sabia que cobra e lagarto não se podem ver e existe entre eles  uma raiva de morte um pelo outro.
Naquele dia ficou muito preocupado, pois olhando para o carril poeirento, viu o rasto das patas do Lagarto e o ondulado deixado pela Cobra.
Deduziu de imediato, que ambos estavam a usar o mesmo trilho e mais tarde ou mais cedo iam encontrar-se se seria uma desgraça.
Para evitar que eles se matassem um ao outro, um dia esperou pelo Cobra para lhe falar.
Era uma cobra bem lustrosa e bem tratada, media perto de um metro de comprimento, era acinzentada de listas castanhas e tinha uns olhos que brilhavam como dois diamantes.
Quando a cobra saiu de traz do Marmeleiro, mandou-a parar e falou com ela dizendo:
- Cobra Malhada, gosto muito de ti e gosto que passes pela minha horta, sei que apanhas os ratos que andam por lá a roer as minhas batatas, mas aconselho a que não passes por este carreiro, pois também passa por aqui o Lagarto Pintado, que é muito mau e pode dar cabo de ti.
A cobra não gostou e retorquiu:
-Isso é que era bom!….ele que experimente a enfrentar-me, vai ver que nunca mais come escaravelhos.
Mas o dono da horta insiste:
-Olha que é melhor um acordo que uma boa guerra,
 eu sei que dum confronto entre vocês, poderá resultar uma desgraça para ambos e eu preciso do Lagarto Pintado para comer os escaravelhos que infestam a minha horta, e de ti para que os ratos não me comam as batatas-doces.
A cobra foi-se embora sem dar mais resposta e o Ti , apreensivo ,foi dar uma volta pela horta é procura do lagarto.
Encontrou-o refastelado ao Sol, num carril  poeirento que conduzia até á nora.
Era um belo exemplar, tinha perto de 40 cm de comprimento, estava gordo pois tinha comida com fartura naquela horta.
Como tinha mudado de pele há pouco tempo estava verde com pintas pretas, amarelas e azuis, de olhos grandes e brilhantes.
O Ti , aproxima-se e começa  falar com ele:
-Lagarto Pintado, tenho muito gosto de te ver por aqui, vejo que estás gordo e tens a barriga cheia de escaravelhos.
O lagarto espreguiça-se, levanta o pescoço abriu a sua grande boca que até deixava ver o rosado do fundo da garganta e diz:
- E eu também gosto muito de passear pela tua horta, aqui há de tudo, borboletas pachorrentas que se deixam apanhar, joaninhas distraídas e escaravelhos preguiçosos, que só servem  para te roer as ramas das batateiras, mas vou dando conta deles todos.
- Muito bem, continua o Ti Zé, mas tenho uma recomendação a fazer-te.
Eu sei que passas pelo mesmo carreiro que a Cobra Malhada, e isso pode dar problemas, pois eu sei da raiva que existe entre as vossas famílias.
O lagarto não se fez esperar e responde:
-Ela que não se atreva a cruzar-se comigo, pois  esmago-lhe  a cabeça em menos de nada.
O Ti ...homem experiente e de bom senso, continua:
-Lagarto Pintado, pensa bem no que te digo. A horta é grande e o «carreiro dos silvados» também, tu bem sabes que tem um Marmeleiro a meio, onde passaste ainda hoje.
 Aconselho-te a que passes pelo lado sul do Marmeleiro e deixando o caminho livre para a Cobra Malhada do lado norte.
O lagarto dando ao rabo, riu-se do Ti Zé, e sem lhe prestar mais atenção foi-se embora sem mais conversa.

Passados algumas semanas, á hora da sesta , hora em que estava muito calor, o Ti ,lembrou-se que é nestas horas de calor que as cobras e lagartos gostam de passear e resolveu também ele  ir até á horta ver o que passava por lá.
 Seguia pelo carreiro habitual,e olhando ao longe, avista um vulto estranho  no trilho empoeirado, que parecia um novelo de corda.
De imediato teve um mau pressentimento e apressou o passo para ver o que era aquele misterioso vulto.
Ao chegar junto do Marmeleiro, viu que era a Cobra Malhada toda feita num novelo, não se descobrindo onde tinha a cabeça.
Na esperança de salvar a situação que temia, começou a desenrolar a Cobra puxando-a com jeito, mas á medida que desenrolava a cobra foi descobrindo o corpo do Lagarto Pintado que estava no meio do novelo.
Desconsolado, verifica que ambos tinham já morrido …a cobra morreu asfixiada com  a cabeça dentro da boca do lagarto  e este não resistiu ao esmagamento a que foi sujeito pelo aperto da cobra em volta de seu corpo ,morreu também.
Moral da história:
Nunca se deve desprezar uma proposta de acordo em situações de antagonismos profundo.
É  sempre preferível um acordo, ainda que não seja o ideal, a uma guerra cujos resultados são sempre imprevisíveis, quantas vezes fatais para ambos os contendores, como  aconteceu nesta história verdadeira, pois esta cena foi presenciada por quem acabou de a contar

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 António Feliciano